Hertzberger - Análise

 

ATIVIDADE Nº 13 - HERTZBERGER, H. - LIÇÕES DE ARQUITETURA


  • Análise do meu espaço doméstico/cotidiano sob o ponto de vista dos conceitos apresentados por Hertzberger no livro HERTZBERGER, Herman. Lições de arquitetura, 1999.

HERTZBERGER, Herman. Lições de arquitetura, 1999.


Na obra “Lições de Arquitetura”, o autor holandês Herman Hertzberger transmite alguns conceitos teóricos sobre o fazer arquitetônico na atualidade, utilizando de construções reais para explicitar tais conceitos. A partir dos ensinamentos, uma análise do meu espaço doméstico/cotidiano será redigida. 

Partindo do meu quarto, os primeiros tópicos a serem trabalhados no livro (Parte A - 1 Público e Privado; 2 Demarcações Territoriais; 3 Diferenciação Territorial) podem ser exemplificados. O uso diário do espaço pertencente ao meu quarto é praticamente restrito a mim, assim como as responsabilidades quanto a manutenção e a posse da chave de acesso, fatores que tornam o espaço mais íntimo e privado em relação a outros cômodos da casa, de uso comum a todos os moradores.  

Em adição a isso, a localização do meu quarto, assim como a escolha de alguns materiais, são outros fatores que contribuem para a demarcação e a diferenciação territorial do ambiente em questão. Situado em um corredor na parte mais interna da casa, e contendo uma porta maciça de entrada pouco convidativa, o acesso a visitantes (não-moradores da casa) ao meu quarto é mais restrito, necessitando de uma espécie de “autorização” - um convite.  

Além disso, a organização interna, bem como as decisões de uso do espaço interno e da utilidade dos mobiliários é de minha livre escolha. Um dos mobiliários no interior do quarto corresponde a uma mesa branca com cerca de 2 metros de comprimento, sem função predefinida, correspondendo apenas a uma “prancha” livre. A partir disso, a maneira como utilizo o móvel e as funções destinadas para cada “ponta” da mesa demarcam o zoneamento territorial do ambiente. Ao tratar sobre tal aspecto, Hertzberger pontua, no quarto tópico da parte A, como o caráter de cada área depende do ordenamento do espaço e do responsável por ele. 



Nas áreas de uso comum e interno da casa, a criação de um novo andar paralelo e mais elevado, com acesso por meio de uma nova estrutura - uma escada na cozinha - gerou novas formas de uso do ambiente, além de mudanças na organização do espaço. A principal diferença foi em relação aos diversos usos que a nova escada oferece. Além da função básica e primordial que da estrutura de fornecer acesso ao novo andar, o uso da escada como local para se sentar é frequente devido à largura da estrutura e ao tamanho avantajado dos degraus. Para conversar com alguém que está cozinhando, por exemplo, um indivíduo, ao se sentar no topo da escada, encontra-se relativamente confortável (por não estar em pé) e possui seus olhos no mesmo nível de quem se encontra em pé na cozinha, facilitando a comunicação.  

A partir dessa percepção e levando em consideração os conceitos trabalhados no livro nos tópicos Parte B – 1 Estrutura e Interpretação; 2 Forma e Interpretação; 6 Funcionalidade, Flexibilidade e Polivalência, pode-se afirmar que a estrutura padrão da escada, invariável enquanto forma, pode ter a sua função variada de acordo com a interpretação, sendo, portanto, polivalente. 



Ainda a respeito dos conceitos citados acima, é possível analisar, no exterior da casa, uma espécie de mureta, construída de maneira que “admitisse a interpretação para assumir sua identidade pelo uso”. Nesse trecho, presente na ‘Parte B – 8 Criando Espaço, Deixando Espaço’ do livro, Hertzberger trata sobre a necessidade dos projetos em possuir a ampla eficácia chamada de polivalência, salientando que “quanto mais rica for a variedade oferecida, maior será a capacidade da casa para corresponder aos mais ricos e variados desejos de seus moradores.”  

A partir desses princípios, a mureta em questão foi construída ao redor de uma área verde a partir da necessidade de separação entre o jardim com a goiabeira e a parte cimentada. Porém, ao invés de servir simplesmente como um cercado, a mureta possui a largura média de um banco padrão e recebeu acabamento de pedra natural, servindo como assento, como local de apoio para objetos utilizados nas atividades externas e como plataforma auxiliar na colheita das goiabas diretamente do pé.  

Dessa forma, ficam claros os caráteres estruturais, polivalentes e interpretativos, apontados nos tópicos 1, 2, 6 e 8 da Parte B, como características da estrutura em questão - a mureta. 



Presente dentro das limitações do lote e agregada à casa há, ainda na parte exterior correspondente ao quintal, a presença de uma varanda com um degrau rebaixado de entrada destinando o acesso a uma segunda porta de entrada, indicando a presença de uma segunda construção - um escritório de contabilidade. Retomando os conceitos de ‘Público e Privado’ (Parte A – 1) e de ‘Demarcação Territorial’ (Parte A – 2), é possível observar que, em uma relação entre o escritório e o jardim, o escritório é mais privado que o jardim aberto, uma vez que ter acesso à área externa não implica no acesso ao interior do escritório.  

Por outro lado, ao analisar a relação entre o escritório e a casa com seus aposentos, o escritório possui caráter mais público devido à aleatória e restrita circulação de clientes apenas no espaço profissional do escritório, sem contato com as dependências da casa. Esses aspectos exemplificam como “o caráter público do espaço é temporário por meio do uso”.  

Além disso, uma escada interna em caracol metálica conecta o interior da sala principal do escritório, de uso único pelo meu pai, ao interior da minha casa, excluindo a necessidade de acessar a área externa para transitar entre os ambientes. Levando em consideração os conceitos apresentados na ‘Parte A – 12 O Acesso Público ao Espaço Privado’ e as relações de público-privado estabelecidas anteriormente entre a parte íntima da casa e o escritório, essa escada constitui-se como um caminho interno de conexão entre duas áreas com diferentes demarcações territoriais, tornando o ‘domínio privado’ mais acessível - pelo meu pai - e o ‘domínio público’ mais intensamente utilizado – pela família. 


Além disso, a varanda citada acima é a responsável pela transição entre a área aberta externa do jardim e o ambiente interno do escritório, constituindo-se como um intervalo. Definido na ‘Parte A – 6 O Intervalo’, os intervalos eliminam a divisão rígida entre áreas com diferentes demarcações territoriais. No caso do escritório, a varanda é, também, o local de boas-vindas e despedidas entre o contador, meu pai, e seus clientes. 

Explorando ainda a ideia de intervalo, uma segunda varanda, localizada no segundo andar, contorna a parede lateral externa da casa onde se localizam as janelas dos quartos principais e possui uma de suas portas de acesso na parte frontal da casa, voltada para a rua. A partir da varanda, o contato com a rua é estabelecido, mesmo que apenas visualmente. Explicitando o conceito de ‘Visão I, Parte C – 3', a varanda é uma organização espacial que torna possível e estimula o contato visual com o espaço público e, ao mesmo tempo, regula. 


Somado a isso, a existência de uma segunda porta de acesso, localizada na outra extremidade da varanda e afastada da rua, permite o acesso à varanda com maior grau de isolamento e mais intimidade. Essa característica reforça a importância de pontos levantados pelo autor no livro a respeito do zelo “para que o ambiente construído não imponha o contato social, mas, ao mesmo tempo, jamais imponha a ausência de contato social.” 

Outro ponto importante que a presença de duas portas de acesso à varanda exemplifica é o conceito de ‘Equivalência, Parte C – 6', que se refere a coisas diferentes com valores iguais classificadas sem um sistema de hierarquias. Isso também é perceptível com a presença de duas portas de entrada para o interior da casa pelo jardim – a porta frontal da sala e a porta lateral da cozinha – ambas utilizadas diariamente em diversas situações e sem nível de importância distinto entre elas, sendo, portanto, equivalentes. 

Como trabalhado na ‘Parte A – 9 A Rua’, o domínio público da rua deve ser uma extensão comunitária das moradias, um local de contato entre os vizinhos. Esse contato visual com a rua proporcionado pela varanda marca também o caráter da rua como espaço de convivência e coesão social. Além disso, por ser uma rua sem saída e com pouco movimento, o convívio físico e as interações entre os moradores são bastante frequentes, com a presença de crianças brincando no espaço público da rua, vizinhos sentados nos passeios conversando e, algumas vezes, até mesmo jogando baralho. 

Devido a esse uso da rua onde eu moro pelos moradores como “rua de convivência”, fica claro que casas e ruas são complementares. O domínio público, conceito pontuado na ‘Parte A – 10 Domínio Público’, constitui-se como a rua, enquanto o domínio privado diz respeito às casas. Dessa forma, é evidente como o domínio público da minha rua estimula e reflete a interação social entre os meus vizinhos. 

Além disso, em se tratar da minha vizinhança, é possível perceber o ordenamento urbano majoritariamente em ‘grelha’. Em visão aérea, fica clara a disposição das ruas e dos quarteirões em formato de grade. Como ressaltado na ‘Parte B – 4 Grelhas’, esse é um princípio de ordenamento mínimo que reduz o efeito caótico de decisões isoladas no layout urbano. 


Comentários

  1. Sofia aponta diretamente os pontos do livro Lições de Arquitetura em sua análise, provando concretamente que leu a obra. A descrição do ambiente é fluida e bem exemplificada, tornando possível imaginar o funcionamento da casa. As imagens que estão no trabalho complementam a viagem que ela proporciona com a análise. Assim, ela aponta onde sua casa entra em alinhamento com a visão de Hertzberger e também quando ela se difere.

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